sexta-feira, 26 de novembro de 2010

UMBÊ: livre, consistente e engajada

Gostaria de compartilhar com vocês minha imensa satisfação e grande prazer em conhecer o trabalho apaixonado do designer de produto & shaper carioca Bernardo Sodré. Com o espírito livre de um autêntico soul surfer & skateboarder, Bernardo é o coração criativo por trás da UMBÊ, onde desenha seus shapes e alaias com a mesma leveza e intensidade com que dropa uma onda, entregando-se e integrando-se harmoniosamente ao momento, ao meio, à vida. Produzindo desde 2003, a UMBÊ conquistou seu espaço e respeito, tanto pelo design consistente, quanto pelo compromisso ambiental ao desenvolver shapes de bambu e alaias, compostos de materias orgânicos e sustentáveis, selados com resinas e óleos naturais. Todos os shapes possuem um recado ao usuário, que em caso de descarte, deve fazê-lo diretamente na própria UMBÊ, para que o ciclo de vida do shape possa ser completado. Assim é a UMBÊ: livre, consistente e engajada.








60" ENTREVISTA
Confiram abaixo a conversa com Bernardo Sodré!

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(sobre as alaias) ..."para surfar é preciso deslizar sobre uma onda, da maneira mais suave e fluida possível, de forma que se aproveite o maximo de tempo desta onda até que ela venha se extinguir na beira da praia." 
Bernardo Sodré
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60" O que chegou primeiro em sua vida, o surf ou o skate? Como foram estas primeiras experiências?
BERNARDO SODRÉ: O skate chegou primeiro mais como uma forma de brincadeira da criançada vizinha da rua do que realmente como um esporte. As primeiras experiências foram bastante aterradoras, ainda lembro-me de descer a rua apostando corrida e o truck do meu skate ficar preso numa amêndoa (Acidente clássico nas ruas arborizadas do RJ), resultado: alguns dias de molho no hospital, e algumas cicatrizes na cara. Já o surf chegou de uma forma mais natural e simples, por sempre morar próximo a praia, comecei surfando de peito, passando pelo bodyboard e depois para o surf real.


60" Como você vê hoje esse resgate da relação surf  x skate?
BS: Na minha adolescência o skate tinha uma imagem pior do que o surf. Quem praticava esse esporte era sempre visto como drogado, dark ou grunge. Com certeza o resgate foi feito com o aparecimento do Longskate e também com a nostalgia da década de 70, onde todo surfista também era skatista. Hoje em dia você vê todo o tipo de tribo andando de skate, seja para curtir, se locomover ou fazer manobras. Acho essa relação/resgate muito boa e importante para os dois esportes, pois estes nasceram do mesmo embrião, portanto para os praticantes de ambos é uma forma de aprimorar manobras, equilíbrio, e também preparo físico.

60" O que o levou a criar a UMBÊ?
BS: A criação da Umbê aconteceu de uma forma bem despretensiosa. Sou designer de produto com especialização em desenvolvimento sustentáveis. Sempre tive uma afinidade muito grande com marcenaria, e trabalhos manuais, então resolvi desenvolver e produzir para mim mesmo skates e pranchas de surf, não tinha o menor foco em vendê-los, queria mesmo era ter um produto de qualidade e customizado da minha forma, onde eu pudesse passar minha opinião, meu olhar sobre aquilo. Ao longo do tempo os amigos começaram a querer também, e foi onde a brincadeira começou a se tornar um pouco mais seria.

60" A preocupação com a sustentabilidade é algo muito marcante na UMBÊ. E no seu dia-a-dia, manter uma existência menos impactante possível também é uma prioridade? Como isso acontece?
BS: Realmente a preocupação com a sustentabilidade é o foco da marca. Desenvolvo produtos para outras marcas que não tem toda essa preocupação, porém na Umbê, eu posso trabalhar do jeito que eu quero. Por não almejar ganhar dinheiro com ela, posso me dar o luxo de ter um produto sustentável, mas que não seja comercialmente valido, vai comprar quem realmente tiver afim de pagar pelo preço (infelizmente trabalhar de forma sustentável ainda é bastante caro). É engraçado como trabalhar pensando em todos os consumos e insumos gerados e estar sempre pensando numa forma de deixá-los menos impactante afeta o nosso dia-a-dia.

60" O que o levou, como designer, a optar por uma produção artesanal?
BS: Na produção artesanal posso ter mais controle de produção, principalmente no quesito sustentabilidade. 


60" No projeto de seus shapes, há uma intenção "organicista" (no sentido proposto e praticado pelo arquiteto americano Frank Lloyd Wright)?
BS: Essa pergunta é bem profunda hehehehehe. Sinceramente não penso muito em que sentidos meus shapes podem intencionar. A criação dos shapes é muito livre de interferências, tento passar um pouco sobre meu olhar de como é um skate, sempre buscando uma harmonia e equilíbrio nas formas.

60" O outline dos shapes possuem um elegante e bem cuidado desenho, ao “assumir” o nó do bambu e a sutileza de suas linhas curvas, que por sinal remetem a certa brasilidade já reforçada na adoção de nomes como Corisco, Kaipora e Catoco. Esse detalhe no outline agrega uma força poética e identidade muito grande ao projeto destes shapes. Há uma busca pela construção de um design brasileiro em seus projetos?
BS: Com certeza, conforme foi dito na pergunta, tento usar de todos os artifícios possíveis para poder passar um pouco da minha identidade  brasileira nos shapes. Até porque meus maiores clientes são europeus, e o que eles querem além da brasilidade é a preocupação com o meio ambiente.

 

60" O que te inspira?
BS: Amor, contato com a natureza, surfar, água salgada, musica e sons, conhecer gente, trocar informações. Me inspira me conhecer melhor a cada dia, e saber que muita coisa ainda vai acontecer na minha vida.

60" Como os handplanes e alaias surgiram na UMBÊ?
BS: Eu já tinha em mente quando comecei a produzir skates de que queria também desenvolver pranchas de surf, pela ligação que sempre tive com o mar com o surf. Há uns anos atrás, estava na oficina de um amigo meu vendo um livro do Greg Noll e vi umas imagens das Alaias, disse a ele que achava essa pranchas o Maximo, pois pelo que dava pra entender realmente era como os reis havaianos surfavam, devia ser uma experiência quase transcendental surfar com uma dessas. Daí ele me disse, porque você não faz uma? Comecei a pesquisar e vi que na Austrália e Califórnia, já estavam reaparecendo as Alaias produzidas por shapers locais, e ae mais uma vez começando a fazer somente para mim e apanhando um bocado para achar a madeira e formula certa a coisa aconteceu e em seguida muita gente quis ter uma.


60" Num vídeo, em parceria com Addict, você disse sobre as alaias: “você tem que (...) surfá-la bem. Solto na onda. Esquecer manobras, esquecer tudo... só surfar por surfar”. Fale um pouco sobre o desafio de desenvolvê-las e sobre essa forma de vivenciá-las.
BS: A Alaia é para mim quase um divisor de águas no meu surf, eu aprendi e sei que ainda vou aprender muito mais com elas. Por se tratar de uma prancha sem quilhas, de madeira maciça, que tem uma péssima flutuação e bem difícil de ser surfada, eu vejo que realmente só surfa nela quem realmente gosta muito e tem a mente muito aberta. No inicio foi bem difícil me relacionar com ela na água. Então comecei a me colocar na posição dos surfistas da época, os caras só tinham isso para surfar, e surfavam altas ondas e se divertiam a beça. Daí eu comecei a ver que o surf de Alaia, é realmente muito simples, pois basta você remar na onda e deslizar sobre ela até acabar, esqueça manobras, esqueça as quilhas, somente sinta a força da natureza e deixe ela te levar a beira da forma mais natural possível.

60" No surf, a relação do surfista com o shaper é algo muito forte e especial, praticamente um diálogo de confiança, admiração e respeito.  Parece-me que agora o skate começa a nutrir também essa relação. Como você percebe a valorização de relações como esta?
BS: Acho muito importante isto também estar acontecendo no skate. Com essa relação é possível ver que os usuários estão mais exigentes e sabem o que querem, ou ao menos estão na busca de algo que possa lhes trazer mais performance.


60" Hoje o longboard, em seu estilo mais clássico, trouxe para o universo do skate, um ride mais soul, descompromissado, livre de competitividade, onde o foco é muito mais a experiência em si do que a complexidade técnica das manobras.  O que você acha dessa busca por um ride primordial?
BS: Acho ótimo, realmente estávamos precisando disso. Acho que esse descompromisso só traz benefícios para o esporte pois estamos cada vez mais abrindo o leque de possibilidades de uma forma mais livre. Não é preciso copiar ninguém, seja criativo e crie a sua própria manobra, seu próprio estilo de andar ou mesmo seu próprio skate. As grandes corporações já entenderam isso e estão também buscando uma forma de alimentar seus usuários com produtos diferenciados e customizados.

60" A UMBÊ apresenta skates com shapes de até 27”. Há planos para shapes maiores, com características mais voltadas ao longboard clássico?
BS: Com certeza, minha escola de surf é do longboard, unindo o clássico com o progressivo. Nada mais justo do que ter no quiver um longskate, até porque é ótimo para treinar manobras.

 


60" Qual o próximo passo para a UMBÊ?
BS: Continuar criando e desenvolvendo sempre buscando sustentabilidade e harmonia. A Umbê é o meu laboratório onde me dou o tempo para criar o que eu quiser, por ter essa liberdade sempre vou buscar desenvolver produtos que possam passar um pouco sobre mim e meus objetivos. Certamente novas pranchas, skates e outros vão sair do forno. 

Conheçam todo o quiver da UMBÊ acessando aqui.





Um comentário:

  1. Boas vibrações transmite o Bernardo ao conseguir realizar o ciclo completo de costruir o seu próprio equipamento de diversão com muita qualidade e cuidado.

    Mais uma grande entrevista do 60 Polegadas... é sempre bom descobrir iniciativas como esta e constatar que existe um movimento positivo de cultura surf/skate crescendo no Brasil.

    keep it rolling!

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